Este blog é um conjunto de colunas que escrevo.

(Péssima introdução, mas leiam mesmo assim!!)

Divirtam-se e por favor, COMENTEM!





Columns 5-A pequena sereia


Mulheres deveriam se revoltar. Não somente por que foram injustamente tratadas durante, não apenas anos e mais anos, nem mesmo séculos e mais séculos, mas milênios e mais milênios (ou pelo menos cinco deles), mas também por serem enganadas.
Sim, corajosas mulheres de 1914 tiveram a audácia de fumar cigarro, ato de exclusividade masculina na época, o que significa que a mulher que fumava um único cigarro provocava aberta e imediatamente os homens e suas regras usurpando seus privilégios (lembre-se da Rose de Titanic). Estas mulheres fumantes reivindicavam direitos como o voto e independência financeira. Nos anos oitenta, mulheres passaram a usar ombreiras e a desprezar qualquer ser do gênero masculino que se oferecesse para pagar a conta do jantar. Conquistaram um espaço no competitivo mundo do trabalho e saíram por aí, revoltadas e ávidas para vingar-se dos insultos misóginos que suas companheiro de gênero sexual tiveram que ouvir durante milênios e mais milênios (ou pelos menos cinco deles).
O que raramente pensamos é que quem era responsável pela educação dos homens e das mulheres eram, salvo poucas exceções, mulheres. O que significa que o comportamento recluso das mulheres era ensinado por mulheres, da mesma forma que os misóginos estúpidos também eram criados por mulheres. O que basicamente significa que, de certa forma, a propagação da sociedade machista se fazia graças às próprias mulheres!... Insano, não? Que mulheres bobas, podemos pensar, mas às vezes me pergunto se a situação é tão diferente assim hoje em dia... Não em relação ao tratamento injusto, mas em relação à enganação.
De fato, como ia dizendo o sexo feminino deveria unir-se e revoltar-se não apenas devido ao tratamento injusto e vergonhoso que elas agüentaram durante milênios e mais milênios (ou pelo menos cinco deles), mas também por que são enganadas. Enganadas por quem? Por elas mesmas!
Desde pequenas meninas são criadas para sonhar com um príncipe encantado. Um príncipe forte, bonito, corajoso, e honrado, que esteja disposto a enfrentar um dragão e libertar a doce princesa encarcerada na torre mais alta do castelo amaldiçoado. Conforme vai crescendo, a doce princesa se transforma numa princesa com TPM (o que a faz se parecer cada vez mais com o dragão e cada vez menos com a princesa), e o príncipe forte, bonito, corajoso e honrado vira um príncipe com espinhas, depois um príncipe safado e galinha, depois um príncipe casado (com outra princesa de TPM) ou salafrário (quem sabe com várias outras princesas de reinos muito muito distantes). Ou seja, no fim da história os dois personagens principais sofreram graves mutações e não há mais princesa, e muito menos príncipe.
Com a idade, a inabalável fé em contos de fadas (leia-se: inabalável fé no príncipe encantado) se evapora, e a princesa de quatro anos cede seu lugar a uma cética e desconfiada mulher de 20 e poucos anos... O problema é que estes malditos contos de fadas foram tantas e tantas vezes repetidos para tantas a tantas gerações de mulheres que praticamente já fazem parte do DNA da cética e desconfiada mulher de 20 e poucos anos. O que faz com que, por mais cética e desconfiada que seja, a mulher ainda possui uma tênue e escondida fé no príncipe encantado. Mas não tem jeito: príncipes encantados vivem no lindo e maravilhoso, porém inexistente mundo dos contos de fadas, e as princesas de TPM vivem no frio difícil e cruel mundo da realidade. Do mesmo jeito que Emma Bovary foi levada a acreditar na existência inexistente de um homem elegante, sensível, corajoso, honrado, e inteligente, as mulheres do dias de hoje também são treinadas para acreditar na existência de algo que não existe e não pode existir (enganadas!). E treinadas por quem? Pelas outras mulheres. No livro Madame Bovary, a personagem romântica morre por que não pode sobreviver num mundo realista, na vida real e atual, as mulheres sobrevivem às decepções, frutos de convicções tiradas dos contos de fadas, com a ajuda de outras mulheres que reforçam essas mesmas convicções (“não se preocupe, ele vai aparecer, ele vai”, e se o príncipe espinhento de fato não aparecer “não era para ser, este daí não era seu príncipe, era sapo mesmo”)... Enganação atrás de enganação.
Se Emma Bovary foi enganada pelos românticos que a levaram a crer que homens perfeitos e apaixonados de fato existem, as menininhas de hoje em dia e futuras mulheres de hoje em dia são enganadas por uma coisa chamada Walt Disney. Sim, por que eu sei que quando você era pequenininha te fizeram assistir um filme chamado A Pequena sereia. Então eu sei que você acha que no final o príncipe se casou com a pequena sereia e eles viveram felizes pro resto de suas vidas... Mas isso, minha gracinha, é tudo mentira. Se Disney resolveu alterar um pouco o conto de Andersen acredito que seja por que deve ter chegado à inteligentíssima conclusão de que nenhuma mulher ou princesinha gostaria de saber que a pequena sereia salvou o príncipe, que ela se transformou em humana através um muitíssimo doloroso procedimento para ficar com seu príncipe, que o príncipe prometeu casar-se com ela e que no final o f... do príncipe decidiu casar-se com outra fazendo com que a sereiazinha virasse espuma do mar.
O que significa que no final das contas a pequena sereia se ferrou, assim como outras heroínas dos contos de Grimm, Perrault e Andersen, que foram todos adaptados pela infeliz Walt Disney que por sua vez encoraja meninas indefesas a acreditarem numa mentira. Claro que são as mamães que contam essas histórias de príncipes e princesas para suas filhinhas, inclusive mães divorciadas, mães sem príncipes... E você pode ter certeza que a cética e desconfiada mulher de 20 anos também vai contar historinhas para sua filha desenvolvendo o lado “acredito em contos de fadas (leia-se: acredito em príncipes encantados)” de seu DNA.
Mas diga a verdade, por mais que você se revolte com suas decepções e jure nunca mais acreditar no príncipe e prometa jamais inculcar idéias malucas e mentirosas na cabeça da sua futura filha, não é um alívio poder acreditar nele, nem que seja por um segundo sequer? Talvez o príncipe não precise ser forte, bonito, corajoso, e honrado, talvez o príncipe seja simples e adoravelmente aquele que enxuga suas lágrimas no final de uma sessão de filme ruim... Talvez, mas não se mate se seu príncipe morre de rir a ver suas lágrimas ao invés de secar-las.