Este blog é um conjunto de colunas que escrevo.

(Péssima introdução, mas leiam mesmo assim!!)

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quinta-feira, 8 de abril de 2010

Columns 6- Elizabeth Bennet? Eu?

No romance Orgulho e Preconceito de Jane Austen, a personagem Elizabeth Bennet recusa a proposta de casamento do Mr. Collins, um homem ridículo, tolo, e absolutamente entediante. Em pleno começo do século XIX, na Inglaterra vitoriana, uma mulher com pelo menos 20 anos de idade (leia-se: relativamente velha para ainda ser solteira), sem um dote particularmente interessante, diz não a um casamento (tradução: diz não a uma perspectiva de futuro, certo, entediante, porém seguro e relativamente confortável, apesar dos pesares). A heroína do romance diz não num momento em que não é possível dizer não, em que não aceitar uma proposta de casamento generosa NÃO É uma opção, ou seja, Lizzy fabrica uma escolha a partir do que ela deseja.

Elizabeth Bennet se dá a oportunidade de escolher até mesmo quando não há escolha possível. Uma atitude admirável para nós, leitores do século 21, que ao longo do século XX, aprendemos a valorizar acima de tudo aquilo que chamamos de escolhas. Valorizamos as escolhas porque elas representam a suposta Liberdade.

Funcionamos de acordo com um lema muito simples: liberdade é escolher. Escolher é afirmar sua liberdade, é ressaltar a vontade individual do sujeito. O indivíduo tem autoconhecimento suficiente para determinar aquilo que deseja, e ele é livre justamente por que pode dar-se ao luxo de escolher. Sartre costumava dizer que o ser humano se constrói. Ninguém existe simplesmente; o homem se define a partir de suas ações, e suas ações são frutos de suas escolhas, o que significa que o homem é aquilo que ele escolhe ser, aquilo que ele deliberadamente e em plena liberdade, escolhe fazer. Você é aquilo que você faz. Não aquilo que você pensa, mas aquilo que você realiza concretamente. Você é o que você escolheu.

Infelizmente, apesar de esta idéia ser muito bonita e mostrar que a responsabilidade de quem se é depende inteira e unicamente do individuo, as coisas não funcionam exatamente do jeito que Sartre previu. Temos, de fato, uma variedade impressionante e até mesmo insana de escolhas. Você escolhe entre 15 mil tipos diferentes de café: mocha, latte, descafeínado, expresso, com chantilly, com açúcar, sem açúcar, com adoçante... Açúcar granulado, açúcar de cana-de-açúcar, açúcar de beterraba, açúcar refinado branco... Passamos nossa vida escolhendo coisas absolutamente superficiais, desprovidas de qualquer importância, e que nos tomam um tempo absurdo. Escolher nosso café no Starbucks ou escolher um filme para alugar entre os 11 mil filmes disponíveis na locadora nos proporciona uma sensação de poder. Temos a impressão de escolhermos tudo e qualquer coisa; dominamos e controlamos tudo que passa por nós.

Um belo dia, resolveu-se que o número de canais de televisão deveria aumentar: passando de apenas um canal para três. A decisão suscitou violentos debates, alguns alegavam que passariam mais tempo escolhendo o programa de televisão do que assistindo de fato o programa, outros explicavam que sérias brigas de família poderiam ocorrer, já que um membro poderia querer ver um filme e enquanto outro preferiria assistir a novela, e o que costumava ser um momento de família unida assistindo a uma mesma coisa se transformaria em quatro pessoas emburradas e desinteressadas assistindo uma tela. Hoje em dia existe uma coisa que atende pelo nome de “Tevê a Cabo”, uma coisa que disponibiliza cerca de 250 canais. Para quê diabos servem 250 canais? Será que existe alguém no mundo que assista tanto televisão que precise de 250 canais? Apertamos 250 vezes no controle remoto até darmos uma olhada na totalidade dos canais e termos mais ou menos uma idéia do que poderíamos assistir. Esses 250 canais não são para aumentar a liberdade do homem e fazer com que ele possa escolher um entre 250 programas, esses 250 canais existem para ajudar as pessoas que não sabem escolher. Na maioria das vezes, acabamos assistindo simultaneamente três programas, pulando de canal para canal durante os intervalos respectivos. Isso não se chama escolher, não se chama dominar as escolhas e realizar suas vontades e seus desejos, se chama ser escravo de uma avalanche de opções mínimas e pouco importantes.

A inconveniente verdade, é que vivemos a partir daquilo que é possível fazer e não do que podemos ou queremos fazer. Escolhemos entre opções aceitáveis para o meio onde vivemos. Escolhemos dentro daquilo que a sociedade fornece como uma escolha possível, e não dentro daquilo que nós mesmos determinamos como escolhas interessantes e plausíveis. No fundo, não há essa suposta liberdade ilimitada de escolhas, há somente uma profusão de opções para escolhas supérfluas. Como não somos capazes de escolher fazer algo realmente importante, nos consolamos com um passatempo chamado “brinque de escolher coisas irrelevantes”. O que Elizabeth Bennet fez no romance de Jane Austen é impossível até nos dias de hoje, por que se Lizzy materializou seu desejo criando uma opção alternativa que lhe permitisse de fato escolher se queria ou não casar-se com Collins, nós, reles mortais, não somos corajosos o suficiente para criar nossas opções em função de nosso potencial ou desejo... Por enquanto, somos apenas corajosos o suficiente para conseguirmos escolher entre aquilo que nos é oferecido como escolha.

(E cá entre nós, ainda bem!)

2 comentários:

Anônimo disse...

Está meio tarde e eu estou um pouco falho no momento, Mas me sinto obrigado a questionar alguns pontos do seu raciocínio.

A liberdade aparece na possibilidade de escolher, e não na escolha em si. Uma pessoa livre não é aquela que escolhe, é aquela que pode escolher e em total consciência dos seus atos e de suas consequências. E isso faz toda a diferença.

Bennet não se dá a oportunidade de escolher, perguntam para ela: "Você quer se casar?", ela simplesmente se arrisca, ela é tola, ela joga o futuro na sorte. O que ela se diz: Seria muito vantajoso para mim me casar de um lado, mas de outro, eu não quero me casar por causa de A ou de B. O que acontece é que a idéia de ser mal vista pela sociedade, de não ter segurança nenhuma, ainda é melhor do que ter de casar com tal pessoa, é uma escolha, só que há uma inversão nos parâmetros da época. Na cultura da época o casamento é impossível de se rejeitar por que o objetivo da mulher é se casar com alguém que lhe traga conforto. O que acontece é que para ela aquele homem não era o bastante para lhe dar conforto. Então ela, que sempre teve a opção de dizer não, o faz. Não vejo aonde não é uma opção.

Agora falemos um pouco sobre a televisão a cabo. Qual a diferença entre ter 3,10,20,250 canais? Só dá para assistir 1 por vez mesmo. Quem em sã consciência precisa de mais do que 1 canal? Mas se formos pensar bem, o homem é feito também de criar novas opções. Quando alguém compra um celular top de linha, não o compra por que quer usar todas as funções dele, mas que se ela precisar, vai ter acesso a função que precisa. A pessoa que tem 250 canais nunca espera assistir 250 canais, mas acredita que algum dia aquilo lhe seja útil. E tenho que dizer, se os 250 canais fossem inúteis, eles já deixariam de existir faz tempo.

O que é verdade é que nossas escolhas são sempre feitas com um padrão de segurança. Por que eu vou prestar todas as universidades e não só uma? Por que é mais seguro.

Toda escolha está submetida a esse fator até onde ele é possível. Nós tendemos a aumentar o número de possiblidades para que as escolhas nunca sejam definitivas, para que algum erro possa ser eventualmente corrigido no meio do caminho. Mas sim, nós fazemos escolhas. Quando eu decido sair de casa definitivamente, isso é uma escolha. Quando eu decido pedir alguém em casamento, isso é uma escolha.

Mas o fato é que todas as opções estão lá. Só precisamos pegar a que mais nos agrada.Se nós pensarmos bem, Bennet não criou a opção, ela existia, o fato é que ela foi capaz de se arriscar.

O problema é que o homem não está preparado para coisas definitivas. O homem não quer pensar que não tem como voltar, por isso algumas escolhas são muito mais importantes que outras, por que elas não podem ser revertidas ou arrumadas.

Uma escolha que só tem uma opção não é uma escolha. Se Lizzy era obrigada a se casar, ela não está escolhendo, ela está sendo forçada. O que é contra o princípio de liberdade. Por isso digo que ela sempre teve a escolha, ela não criou nada. Só foi corajosa o bastante para disperdiçar uma chance esperando que no futuro uma melhor aparecesse.

Sordaria disse...

Parabéns pelo blog! è ótimo poder discutir. Muitas vezes temos preguiça de pensar e admiro quem não se acomoda na ociosidade fútil.